15 de nov. de 2011

Origem da Umbanda - Parte 2 - Raízes Históricas - Raíz Ameríndia ou Adjunto de Jurema




Saibam vocês, meus irmãos umbandistas, brasileiros ou não, que os nossos ÍNDIOS, especialmente os TUPY-NAMBÁ, TUPY-GUARANY, pelas alturas do ano de 1500, NÃO ERAM TRIBOS OU UM POVO PRIMITIVO QUE ESTIVESSE NA INFÂNCIA DE SUA EVOLUÇÃO. Quem supôs isso, foram os brancos conquistadores.  

Não tiveram capacidade para verificar que, em vez de ser um povo primitivo, era, sim, um POVO ou uma raça tão antiga, que se perdia por dentro dos milhões de anos a sua origem... Também, eles – os portugueses que aportaram com Cabral e mesmo, posteriormente, nas terras dos brasis, não vieram para estudar a antiguidade, a cultura, a civilização etc., de nossos aborígines.... 

Os Tupy-nambá, os Tupy-guarany, como ficou constatado muito depois, por inúmeras autoridades e estudiosos pesquisadores, era um povo que estava em franca decadência, isto é, no último ciclo de sua involução... 

Para que você, meu irmão umbandista, entenda isso, de maneira simples, atente a essa verdade: é “ponto fechado”, são fatos históricos, são verdades ocultas ou são dos ensinamentos esotéricos que, toda Raça surge, faz sub-raças, evolui sob todos os aspectos e, depois, entra em decadência, para dar lugar a outra nova Raça. 

É preciso que compreendamos essa questão de decadência das raças. O que tem acontecido é o fenômeno das “migrações espirituais” ou seja: os espíritos vão deixando gradativamente de encarnar numa raça, ou melhor, na última sub-raça, para irem animar novas condições, em novos movimentos de novas correntes reencarnatórias, para se constituírem em nova Raça. Assim, o que os espíritos abandonam, obedecendo as diretrizes de uma Lei Cármica, Superior – são os caracteres físicos de um raça e sua espécie vai diminuindo, diminuindo, por falta do dinamismo das reencarnações, até se extinguir ou na melhor das hipóteses, conserva os remanescentes atrasados, porque os outros, a maioria, os mais adiantados não voltam mais. 

Portanto, a humanidade, obedecendo à Lei dos Ciclos e dos Ritmos, evolui constantemente, porém através de várias raças. Algumas dessas Raças já nos precederam e passaram por duas fases: uma, ascendente e de progresso e outra, descendente ou de decadência.  

Foi, dentro desse critério, desse conceito, dessa verdade, que a antiga tradição de todos os povos atesta a passagem pela face da terra de Raças assim qualificadas: 1ª a Raça pré-Adâmica; 2ª a Raça Adâmica; 3ª a Raça Lemuriana; 4ª a Raça Atlanteana; 5ª a Raça Ariana, que é a nossa, a atual, no início de sua Quinta Ronda Cármica etc.
Porque 7 são as Raças-raiz, 7 são as Rondas Cármicas, 7 são os ciclos evolutivos, pelos quais, terá de passar toda a Humanidade. Portanto, já passou por 4 dessas condições e está na 5ª; falta ainda passar por mais 2 Raças, 2 Rondas e 2 Ciclos, que virão no futuro, daqui a milhões e milhões de anos. 

Foram diversos os fatores ou as causas que contribuíram para a decadência e consequente desaparecimento dessas Raças pré-históricas, com suas civilizações: causas psíquicas ou morais, físicas, cósmicas (cataclismos), biológicas, mesológicas etc.
As suas civilizações – todos os documentos, todos os códigos, todos os ensinamentos da antiga tradição o atestam – foram adiantadíssimas, sob todos os aspectos. 

Foi, portanto, um povo, os Tupy-nambá, dos Tupy-guarany etc. – já na última fase de acentuada decadência da raça, ou seja, dentro das condições citadas, porém ainda com os vestígios positivos de uma avançada civilização que os portugueses encontraram no Brasil do ano de 1500... 

O povo dos Tupy-nambá, dos Tupy-guarany, da era pré-cabralina era tão adiantado, tão civilizado, quanto os outros povos que habitaram a América do Sul – na época deles – assim como os Maias, os Quíchuas etc. 

Suas concepções, sua mística, enfim, sua Teogonia, era de grande pureza e elevação, somente alcançada, pelos que já vinham dentro de uma velhíssima maturação espiritual. 

E a prova insofismável disso era a sua língua – o Nheengatu, o idioma sagrado, a língua boa, incontestavelmente um idioma polissilábico. 

O Nheengatu – o idioma sagrado dos Tupy-nambá, dos Tupy-guarany – revela claramente, em sua morfologia, em seus fonemas, no seu estilo metafórico etc., ter sido uma língua raiz, polida, trabalhada através de milênios. Foi tão bem trabalhada essa língua polissilábica, que se presta às mais elevadas variações ou interpretações poéticas. Dela derivaram diversos idiomas, também considerados antiquíssimos.

Vamos, então, verificar por dentro de sua teogonia a pureza de suas concepções sobre as coisas divinas etc., pois os tupy-nambá, os tupy-guarany eram, sobretudo, um povo monoteísta. 

Acreditavam, adoravam a um Deus-Supremo sobre todas as coisas, a quem chamavam com muita veneração de TUPAN.  

TUPAN ou TUPÃ – de tu, que significa ruído, estrondo, barulho e pan, que significa ou exprime o som, o estrondo, o ruído feito por alguém que bate, que trabalha, que malha etc. 

TUPAN era, portanto, o Supremo Manipulador, isto é, Aquele que manipula a natureza ou os elementos. É o divino Ferreiro que bate incessantemente na Bigorna Cósmica. Era considerado, sem dúvida alguma, o Supremo Poder Criador. 

Veneravam a GUARACY, YACY e RUDÁ (ou Perudá), como a tríplice manifestação do poder de Tupan. Eram atributos externos. 

GUARACY – o SOL – de Guará, vivente e cy, mãe. Davam essa dupla interpretação: Pai ou mãe dos viventes no sentido correto de que o Sol era – e é – o princípio vital que animava todas as coisas da natureza, o mesmo que a luz que criava a vida animal, etc. Guaracy era, sem dúvida, a representação visível, física, do Poder Criador que, através dele, criava nos elementos da própria natureza, as coisas, os seres etc. Enfim, era o elemento ígneo – o pai da natureza.  

Por isso, diziam, dele, Guaracy, saía tatauy, as flechas de fogo de Tupan, os raios do céu que se transformavam em tupacynynga, o trovão. Por causa disso é que certos interpretadores “ligeiros” deram Tupan como sendo, puramente, o “deus do trovão”... 

YACY – a LUA – de Ya, planeta e cy, mãe ou progenitora: era a mãe dos vegetais ou ainda a mãe natura.  

RUDÁ ou PERUDÁ – o deus ou divindade que presidia ao AMOR, à reprodução. Rudá era evocado pelas cunhãs (mulheres), em suas saudades, em seus amores, pelos guerreiros ausentes, para que eles só tivessem pensamentos e coração para recordá-las. 

E para reafirmar esse tríplice conceito teogônico, os payé (sacerdotes) ensinavam mais que, Guaracy representava o Eterno masculino, o princípio vital positivo quente de todas as coisas. E Rudá era o intermediário, isto é, o amor que unia os dois princípios na “criação da natureza”... 

Acreditavam mais em MUYRAKITAN, ou MURAYKÍTAN, termo oriundo de uma língua matriz, de tal antiguidade, que “somente Tupan era quem podia tê-la ensinado à raça mais antiga de toda a Terra”. Essa língua era o ABANHENGA, que surgiu com a primeira raça que nasceu na religião de brazilan (Nota 3 – Não pretendemos, nesta singela obra, nos estender, com estudos ou provas, sobre a antiguidade do Brasil – e das Américas – os brasis, o brazilan dos primitivos morubixabas. Todavia, os que quiserem ver como a História do Brasil – e da América – está “incerta”, adulterada, podem recorrer às obras de reconhecidas autoridades, cientistas internacionais, assim como: Lund, Ameguino, Pedberg, Gerber, Hartt, H. Girgois, etc., bem como nas obras de Alfredo Brandão, Domingos Magarinos e outros. 

Através de toda essa literatura, científica, histórica etc., se comprova que: a primeira região a emergir do pélago universal – das águas oceânicas – foi o Brasil; que o homem surgiu na era terciária – e não na quaternária, como é de ensino clássico – aqui no Brasil; que a escrita mais antiga de toda a humanidade tem sua origem na primeira raça que surgiu na primeira região do planeta Terra, que adquiriu as condições climatéricas para isso – o Brasil, isto é, o seu planalto central...) conforme reza o TUYABAÉ-CUAÁ - a Sabedoria dos Velhos Payés (do que falaremos adiante). 

MUYRAKITAN ou MURAYITAN se decompõe assim: de mura, mar, água; yara, senhora, deusa e kitan, botão de flor. Portanto, pode ser interpretado corretamente assim: “Deusa que floriu das águas, Senhora que nasceu do mar, Deusa ou Senhora do mar”.  

Veneravam muito esta Divindade, a quem prestavam um culto todo especial. Acreditavam em seus poderes mágicos e terapêuticos, através de seu itaobymbaé – espécie de argila de cor verde, uma substância nativa, colhida no fundo de certos lagos, a qual transformavam num poderoso amuleto, que adquiria a forma de um disco. 

Os itaobymbaé só podiam ser colhidos e preparados pelas ikannyabas (as conhãtay ou moças virgens que eram votadas, desde a infância, como sacerdotisas do culto de MUYRAKITAN, o qual era vedado aos homens. Posteriormente, isto é, no período da decadência, se transformou no culto de Yuremá, dito na adaptação do elemento branco como o adjunto da Jurema). 

Essas sacerdotisas eram as únicas criaturas entre os tupy-guarany que podiam preparar esse talismã e o faziam assim: esperavam sempre que YACY, a lua, estivesse cheia, estendendo a sua luz sobre a placidez das águas do lago escolhido pelas ikannyabas, que, dentro de uma severa preparação ritualística e mágica, para ele se dirigiam. Esse preceito implicava na passagem da árvore da YUREMÁ verdadeira, onde invocavam ou imantavam os fluídos magnéticos da lua, através de cânticos e palavras especiais sobre determinado número de folhas, para serem mastigadas por elas, na ocasião de mergulharem no lago. 

Assim, enquanto algumas dessas ikannyabas mergulhavam, as outras ficavam cantando certas melopéias rítmicas acompanhadas do termo mágico ma-ca-uam. Quando uma ou outra emergia com a substância maleável – a argila verde – as outras colocavam-na em pequeninas formas, já com o formato de um disco, com um orifício no centro. 

Depois de recolhida a quantidade necessária, todas ficavam à beira das águas em cerimônia especial, uma espécie de encantação mágica, toda dedicada às forças da águas – a Muyrakitan, até que Guaracy, o Sol, começasse a nascer, a fim de endurecer com seus raios de luz a dita substância, para ficar como o itaobymbaé. Esses talismãs tomavam uma consistência tão rija, que nada mais poderia ser feito ou talhado sobre eles.

Esses amuletos de Muyrakitan eram verdes, verdes-claros e os mais preciosos eram os de cor branca. Todos eram de uso exclusivamente feminino e usados na orelha esquerda das cunhãs ou mulheres.  

O seu equivalente para os homens era o TEMBETÁ, um talismã de nefrita verde, em forma de T, que os índios traziam pendente no lábio inferior, através de uma perfuração. 

TEMBETÁ, que se originou de Tembaeitá, de Tê ou T, o signo divino (gravado nas pedras sagradas) da cruz (de curuçá); de mbaé, objeto, e de ita, pedra. Pode ser interpretado corretamente assim: cruz feita de pedra (em sentido sagrado). 

O tembetá era um talismã de Guaracy – o Sol – preparado pelos payé ou pelos karayba, para que imantasse o raio, o fogo do céu, enfim, a energia solar. Era o símbolo mágico do “deus-sol”. Também preparavam outros amuletos que tomavam a designação de Itapos-sangas, inclusive os que eram feitos ou recebiam a força de YARA – mãe d’água.  

A muyrakitan ou o itaobymbaé e o tembetá juntos representavam a força mágica de TUPAN – o Deus ÚNICO.  

Agora, meu irmão umbandista, você já deve estar entendendo melhor a questão da “raiz” Ameríndia ou de nossos índios. Mas vamos prosseguir, vamos ver o que significava, entre os tupy-nambá e os tupy-guarany, daquele glorioso passado o TUYABAÉ-CUAÁ... 

Tuyabaé-cuáá – a sabedoria dos velhos payé, era precisamente a tradição mais oculta, conservada através de milênios, de payé a payé, ou seja, de mestre a mestre, de mago a mago, a qual conjugava todos os conhecimentos mágicos, terapêuticos (o caa-yaari), fenomênicos, espiríticos, ritualísticos, religiosos etc.

Essa tradição, esses ensinamentos, essas práticas mágicas, terapêuticas, o mistério das plantas na cura, a interpretação misteriosa sobre as aves, tudo isso era tuyabaé-cuaá. 

O PAYÉ era justamente o mago mais elevado, dentro da tribo. Conhecia a magia a fundo, praticava a sugestão, o magnetismo, o hipnotismo e, sobretudo era mestre no uso dos mantras (Nota 4 – É interessante verificarmos que, hoje em dia, nenhuma Escola conhece mais o segredo dos mantras. Apenas, dentro dos mais altos graus, ensinam certas vocalizações com vogais – uma coisa infantil – doutrinando que “mantras são vocalizações especiais que se imprimem às palavras, num cântico”... Isso não resolve nada, em matéria de magia, na movimentação da força dos elementais. Aprendemos, nós, de nossos “Caboclos” que mantras são vocalizações especiais que se imprimem sobre certos termos, isto é, sobre palavras especiais.)  

O Karayba não tinha a categoria de um payé; era tratado mais como feiticeiro, isto é, aquele que se dava às práticas de fundo negro etc. Posteriormente, confundiram um com o outro. 

Todo movimento espiritual, mágico ou de fenômenos astrais que pudesse afetar a vida da tribo era coordenado pelo payé, que influenciava diretamente o morubixaba, que, como chefe da tribo, praticamente nada fazia sem consultar o payé, que por sua vez também ouvia os anciões. 

Esses velhos magos da sabedoria – os pajés, como se grafou depois – conheciam o mito solar, ou melhor, os Mistérios Solares (simbolizados no Cristo Cósmico), ou seja, a lei do verbo Divino, tanto é que jamais se apagou nos ensinamentos de tuyabaé-cuaá o que a tradição remotíssima de seus antepassados havia legado sobre YURU-PITÃ, SUMAN e YURUPARY e exemplificavam tudo, revelando o mistério ou o sentido oculto da flor do mborucayá (o maracujá), a par com a interpretação que davam a curuçá – a cruz. 

Dentro da tradição, se recordava que, num passado tão longínquo quanto as estrelas que estão no céu, surgiu, no seio da raça tupy, iluminada pelo “deus-sol” uma criança loira, que disse ter sido enviada por Tupan. Falava de coisas maravilhosas e ensinava outras tantas. Recebeu o nome de YUPITAN. 

Assim, cresceu um pouco entre eles e um belo dia, também iluminada pelo sol, desapareceu. Porém, antes disso, disse que noutra época viria SUMAN e depois YURUPARY. Realmente o termo Yupitan tem um significado profundo. 

YUPITAN  –  de  yu,  loiro,  doirado,  e  pitan,  criança,  menino,  significava,  na antiguíssima  língua  matriz,  o  abanhenga,  criança  ou  menino  loiro  iluminado pelo  sol.  Davam-lhe  também  o  nome  de  ARAPITà –  de  ara,  luz,  esplendor,  e pitã, criança etc., e significava o filho iluminado de Aracy, de Ara, luz, e cy, mãe ou progenitora, origem etc. 

Depois,  muito  depois  (reza  a  tradição)  de  terem  passado  algumas  gerações, vindo  do  lado  do  oriente,  aparece  um  velho  de  barbas  brancas,  entre  os  tupy-nambá,  dizendo-se  chamar  SUMAN  (ou  SUMÉ),  que  passou  a  ensinar  a  lei Divina  e  muitas  coisas  mais,  de  grande  utilidade.  Ele dizia,  também,  que  foi Tupan que o tinha mandado. SUMAN também, certo dia, se despediu de todos e pôs-se a caminhar  para  o  lado  do  Oriente  até desaparecer,  deixando  entre  os payé  todo  o  segredo  de  tuyabaé-cuaá  e  assim  ficou  lembrado  como  o  “pai  da sabedoria”...  Entre  os  tupis-guaranis,  também  foi  constatada  a  tradição  viva, positiva,  sobre  YURUPARY  –  o  seu  Messias  (possivelmente,  uma  das encarnações do Cristo Planetário).

Yurupary  –  de  yuru,  pescoço,  colo,  garganta  ou  boca,  e  pary,  fechado, apertado,  tapado,  significa  o  mártir,  o  torturado,  o  sofredor,  o  agonizante. 

YURUPARY, na  teogonia  ameríndia,  foi  o  filho  da  virgem  Chiúcy,  de  Chiú, pranto,  e  cy,  mãe,  a  mãe  do  pranto,  uma  máter  dolorosa  que  viu  seu  filho querido  ser  sacrificado  porque  pregava  (tal e  qual  JESUS)  o  amor,  a  renúncia,  a igualdade e a caridade. 

YURUPARY foi, portanto, entre os tupy-guaranis, um MESSIAS e não o que os jesuítas daqueles tempos interpretaram – o “diabo” (Nota 5 – Tal e qual fez com os africanos, a Igreja  também  quis  fazer  assimilações  entre  os  nossos  índios  com  seus “santos”. Os jesuítas fizeram uma tremenda força, para “identificar” Suman ou Sumé com  o  “Santo  Thomé  ou  Tomé”,  deles.  Mas  não  “pegou”  de  jeito  algum...  Sobre  a Tradição  de  Yurupary,  o  Cel.  Sousa  Brasil  no  tomo  100  do  vol.  154  da  Revista  do Instituto  Histórico  –  2º,  de  1926,  dá  testemunho  irrefutável  dessa  venerada  tradição que  ainda  encontrou  entre  os  nossos  índios).  Tanto  é  que  se  perde  no  passado  de sua remotíssima tradição esse tema de um Messias, da cruz e de seu martírio. Por isso é que veneravam a Curuçá – a cruz – de curu, fragmento de pau ou de pedra e  çá,  gritar  ou  produzir  qualquer  som  estridente.  Curuçá  em  sentido  místico, significa  cruz  sagrada,  porque recebeu  o  sofrimento,  o grito  do  agonizante  ou  a agonia  do  mártir.  Em  certas  cerimônias,  os  payé,  depois  de  produzirem  o  fogo atritando  dois  pedaços  de  pau,  os  cruzava  (para  formar  uma  cruz)  para simbolizar o Poder Criador – o FOGO SAGRADO... 

E foi por causa disso, desse conceito, desse conhecimento, que eles – os índios – receberam com alegria, com amigos, como irmãos, aos portugueses de Cabral, porque  nas  velas  de  suas  naus  estavam  desenhada  uma  espécie  de  cruz.
Pensaram  que  –  segundo  uma  antiga  profecia  –  eles  vinham  para  ajudá-los...  e como se enganaram... 

Mas,  voltemos  a  falar  sobre  os  conhecimentos  dos  payé.  Como  já  dissemos, eram tão profundos os conhecimentos desses magos, tinham conservado tão bem dentro  da  tradição  a  sabedoria  do  Sumé,  que  quando  queriam  simbolizar  para os mborubixabas, para os guerreiros, para as cunhãs etc., a “divina revelação da natureza”,  isto  é,  a  eterna  verdade  sobre  Aquele  enviado  de  Tupã,  que  vinha sempre,  desde  o  princípio  da  raça  e  que  entre  eles  veio  como  Yurupary, exemplificavam este mistério, tomando de uma flor de mborucuyá...  

Mborucuyá (ou maracuyá – maracujá, a passiflora coerulea) revela em sua flor a coisa sagrada; ela obedece Guaracy – o Sol – que é filho de Tupã. Quando ele nasce,  ela  vive,  se  abre  e  mostra  seus  mistérios  e  quando  Guaracy  morre  (se esconde,  no  ocaso),  ela  se  enluta,  se  fecha  (é  a  questão  que  a  ciência  denomina Heliotropismo ou tropismo – pelo Sol).  

Vejam (continuam dizendo), a flor do maracuyá guarda a paixão, o martírio de Yurupary; ela tem os cravos, a coroa, os açoites, a coluna e as  chagas... E assim, reavivava na lembrança todos os conselhos de seu Messias, de seu reformador – o  filho  da  virgem  Chiúcy  (o  próprio  termo  mborucuyá  diz  tudo  em  seu significado:  mboru  que  significa  tortura,  sofrimento,  martírio  e  cuyá  o  mesmo que cunhã, mulher. Então temos: martírio da mulher). 

Assim  eram  os  payé  daqueles  tempos.  Conhecedores  da  magia,  praticavam também todas as modalidades mediúnicas. E eram mais seguros – sabiam o que faziam  e  porquê  –  do  que  os  “pretensos”  pais-de-santos  ou  os  tais  “médiuns chefes” de hoje em dia.... 

Tomavam  precauções  especiais  sobre  os  médiuns  e  “quando  queriam  que  as mulheres  que  tinham  um  dom,  profetizassem,  isto  é,  caíssem  em  transe mediúnico,  primeiro  envolviam-nas  no  mistério  do  caa-timbó  ou  timbó,  isto  é, nas  defumações  especiais  de  plantas  escolhidas,  depois  emitiam  um  mantran próprio para as exteriorizações do corpo astral – o termo ma-ca-aum, dentro de vocalizações especiais e rítmicas. Logo, aplicavam sobre suas frontes o mbaracá. 

Elas  caíam  como  mortas,  eles  diziam  palavras  misteriosas  e  elas  se  levantavam, passando a profetizar com o Rá-anga – os espíritos de luz... 

Mas  o  que  era  Mbaracá?  O  Mbaracá  ou  maracá  era  um  instrumento  que produzia ruídos ou sons especiais. Ele  falava, respondia, sob a ação mágica dos payé.  Enfim,  era  um  instrumento  dotado  de  um  poder  magnético  e  era, positivamente, um canal mediúnico. (Nota 6 – Afirmamos que era um instrumento de  poder  magnético,  porque  tinha  o  seu  preparo  feito  sob  as  forças  da  magia  dos astros.  O  mbaracá,  em  si,  era  uma  espécie  de  chocalho,  manipulado  do  fruto conhecido como cabaceira – a cucurbita lagenaria – e dentro desse fruto [dessa cabaça] eram  colocadas  certas  pedrinhas  ou  seixos.  Essas  pedrinhas  eram  amuletos  ou itapossangas especiais, inclusive o talismã de muyrakitan [o itaobymbaé], bem como o  Tembetá.  Tanto  empregavam  esse  mbaracá  para  os  efeitos  mágicos,  como  para  os fenômenos  ou  da  mediunidade,  para  fins  hipnóticos,  isto  é,  para  ativar  o  ardor  dos guerreiros, no combate...) 

Jamais explicaram ao branco, como procediam para comunicar esses poderes ao mbaracá, em suas cerimônias de bênção, batismo, e imantação... 

Testemunhou essas cerimônias e esses poderes, Sans Standen, um alemão que foi aprisionado pelos tupy-nambá, durante muitos anos e que pôde assistir a esses fenômenos produzidos pelo payé. 

Uma outra testemunha insuspeita também presenciou os poderes mágicos de um karayba e esse foi o padre Simão de Vasconcelos, que relata no livro II das Crônicas da Companhia de Jesus do Estado do Brasil o caso da clava sangrenta. 

Disse ele: “um tal carahyba fixou duas forquilhas no chão, a elas amarrou uma clava enfeitada de diversas penas e depois andou-lhes em torno, dançando e gesticulando num cerimonial estranho, soprando e dizendo-lhes frases. Logo depois desse cerimonial, a clava desprendeu-se dos laços e foi levada pelos ares até desaparecer no horizonte, voltando depois, pelo mesmo caminho, à vista de todos, visando a colocar-se entre as forquilhas, notando-se que estava cheia de sangue”.

Isso no terreno da magia. Na terapêutica eram mestres na arte de curar qualquer doença – muitas das quais, até o momento a medicina oficial tem considerado incuráveis – pelo emprego das plantas, ervas ou raízes. Ao segredo mágico e astral de preparar as plantas curativas, denominavam de caa-yary. 

Caa-yary também era o espírito protetor das plantas medicinais e aquele que se voltava a ele, na arte de curar, não podia nem ter relações com mulher, tal o formidável compromisso que assumia.  

Quando o branco ambicioso quis saber o segredo do caa-yary, os payé, os karayba, diziam que eram o avô da erva – o mate, para despistá-lo. 

Os payé (convém repisarmos) faziam constantemente uma espécie de sessão para fins mediúnicos, ou seja, para evocarem Rá-Anga – os espíritos da luz – a qual denominavam GUAYÚ, que se processava sob cânticos e danças rítmicas (completamente diferentes dessas batucadas que brancos civilizados que se dizem “babás e tatas” fazem, hoje em dia). 

Antes desse ritual mediúnico, tinham um particular cuidado no preparo dos timbó a serem usados, isto é, faziam os defumadores propiciatórios para afastar ANHANGÁ, que era o espírito das almas penadas, atrasadas etc., era, enfim, “mal comparando” o mesmo que o “diabo” dos católicos e o Exu-pagão da quimbanda. 

Essa cerimônia ou ritual dito Guayú era sempre feita, para tirar guayupiá – a feitiçaria, de alguém... 


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